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terça-feira, 30 de julho de 2013

S.O.S - Acudam o município de Portel

Por Samuel Lima (*)

Era o ano de 1978. Estávamos na praia do cemitério, hoje, a praia do Arucará. De repente aparece no horizonte da baía o vulto de uma embarcação. Era o entardecer de um dia, como outro qualquer para nós, moleques, que, como de costume, era natural tomar banho na praia, após uma partida de futebol. A figura daquela nau veio singrando o rio-mar e cada vez mais se aproximando, e ao passo que se aproximava, aumentava de tamanho. 
Ficamos curiosos, pois, era diferente dos barcos conhecidos que costumeiramente vinham à nossa cidade. Não agüentando de tanta ânsia, corremos pra ver do que se tratava. Quando chegamos ao destino almejado, lá estava ele, aportado no Trapiche Municipal - o Navio Coronel José Júlio de Andrade, com três pavimentos e 300 tonelagens de capacidade, tamanho considerado grande pra época, construído em ferro maciço, típico daqueles que só se ver nos filmes hollywoodianos, do Século XIX que percorriam os rios estadunidenses, Missouri e Mississipi. Estava vindo de Monte Dourado. Objetivo de sua vinda: Contratar a preço irrecusável o que Portel tinha de melhor em termos de mão-de-obra para trabalhar no mega Projeto Jarí – empreendimento ambicioso do multibilionário americano Daniel Keity Ludwing. 
Lembro muito bem que muitos coleguinhas de escola não falavam de outra coisa senão “a nossa mudança pro Jarí. Era um corre-corre atrás de transferência escolar. Muitos funcionários da Companhia Amacool pediram demissão quase compulsoriamente, ao ponto de nem darem importância para suas indenizações trabalhistas e as implicâncias dela decorrente no futuro – na expectativa de terem dias melhores naquela gigantesca empresa que era noticiário mundial. A partir de então, hoje imagino que mesmo com a saída de toda aquela gente, nossa cidade não sentiu tanto abalo, do ponto de vista econômico-financeiro, pois, a oportunidade se abriria pra outros, principalmente para os coadjuvantes que preencheriam a vaga de seus oficiais. 
A matéria-prima era abundante na natureza, associada com a fartura de mão-de-obra disponível e de ausência de leis ambientais – o cenário era propício para a atividade madeireira made in brazil. Nunca se imaginava que um dia esse El dourado vegetal viesse ser escasso e motivo de grandes preocupações mundial. Por outro lado, o município de Portel era um encanto de cidadezinha interiorana. Seu povo era e ainda é gentil e cativante. Seus campos, rios e baías e cachoeiras paradisíacas. Sua fartura de carnes, peixes, farinha, castanha e outros produtos vegetais. As revoadas de andorinhas e outros pássaros que encobriam o sol no entardecer. Terra das moças bonitas, das festas populares e dos bailões nos clubes Camel e Fabril. Das prósperas Serrarias com seus eficazes e garbosos operários. Tudo deixava lembranças inesquecíveis nos visitantes e orgulhava os seus habitantes. Ligados a essa terra tranqüila e produtiva, sobressaem os nomes de personagens como Padre Antônio Vieira, Hugo Carlos Sabóia, Coronel Severiano de Moura, dentre outros. Foram tranqüilos os tempos dos prefeitos Oton Alves Fialho, Felizardo Justino Diniz, Elquias Nunes Monteiro e mais alguns, quando a cidade era asseada, as ruas eram trafegáveis, os meios-fios pintados de branco, nas festas cívicas os estudantes desfilavam e cantavam o hino nacional. O sossego público, o respeito e a honestidade eram uma realidade. 
Mas, hoje, tudo está mudado e, infelizmente, para pior. Hoje o município de Portel é uma amostra grátis do Brasil convulsionado, do povo revoltado, das cidades desgovernadas, do erário agredido, dos hospitais desprovidos, da educação reprovada, do desemprego, do alcoolismo e das drogas. Tudo é resultado dos últimos anos e mandatos seguidos de desgovernança e de omissão da fiscalização. E, atualmente, não há um administrador milagreiro que recupere o tempo perdido com o miserável FPM disponível num controvertido mandato de quatro anos. De nada adianta maquiar a cidade fazendo ações paliativas, removendo humildes trabalhadores de um lugar pra outros pra agradar meia dúzia de apaniguados. 
A informalidade evidencia nitidamente os sintomas de uma economia fragilizada. Mas agora nem esta é visível, o que pode ocasionar o passaporte pra atividades ilícitas, como visto nos noticiários negativos de Portel em cadeia nacional. Pouco adianta fazer inauguração de obras faraônicas, quando a maior parte da população não tem vínculo empregatício regular, por conta de um setor produtivo inexistente. O que existia, soube a poucos instantes que está prestes a combalir. Falo aqui da empresa Elmo Balbinot - que por falta de estímulos e ausências de políticas públicas está fechando suas portas, deixando centenas de pais de famílias desempregados, que com certeza, retornarão para Portel em busca de sobrevivência. 
É muito triste para quem viu e viveu os bons tempos e agora se depara com uma cidade decepcionante onde os urubus ocupam as ruas no amanhecer para catar as carniças espalhadas no meio do lixo não recolhido. Os cães vadios e pirentos deitados no meio das ruas. Nas esquinas e nos botecos magotes de desempregados, alguns embriagados, amaldiçoando a sorte madrasta, o desemprego, o preço da farinha, as derrotas dos seus clubes, o abandono em que se encontra a cidade, as mulheres infiéis (dos outros) e o descaminho dos recursos públicos. O povo brasileiro evoluiu no último século. O rádio, a televisão, a internet e a expansão do ensino quantitativo tornaram a cidadania mais esclarecida. 
Mas é incompreensível que, no mesmo período, a decadência da administração pública, a desonestidade geral e o desmoronamento moral da vida familiar avançassem tanto. As causas são discutíveis. E podem ser arroladas na superpopulação do planeta, na tolerância da justiça, na demagogia dos políticos compradores de voto, no avanço da ideologia socialista e nas enganosas bolsas- miséria. E pra piorar, só falta legalizar a maconha. Em cidades outrora ordeiras e pacatas, como Portel, o civismo, a honestidade e o respeito estão sumindo a olhos vistos. As drogas, a prostituição, os assaltos, a impunidade de corruptos e os sons ensurdecedores revelam a constante decadência de populações inteiras. A dúvida atroz é adivinhar onde vai parar essa decadência crescente. Por isso é quase inútil pensar num retorno pleno à paz, à tranqüilidade e à prosperidade de outrora. 
Mas uma cidade de passado heróico e de lembranças tão saudosas merece um esforço de todos que a querem bem, para recuperá-la do estado deprimente em que se encontra, para não figurar como o próximo município brasileiro, no fona do ranking nacional do Índice de Desenvolvimento Humano – IDH (proclamado ontem pela ONU, que apontou nosso vizinho Melgaço, nessa incômoda posição). A luz vermelha já dá sinal de alerta.
*Portelense, economista, pesquisador-chefe do Instituto de Desenvolvimento Socioeconômico do Estado do Amapá e atual Secretário Municipal de Planejamento de Mazagão (AP). E-mail: samlima17@yahoo.com.br – face book: Samuel Barbosa Texto produzido em 30 de julho de 2013 – às 00h25minh

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