Cardeal Raymundo Damasceno afirma em entrevista que ‘não
cabe às igrejas assumir papel partidário’
Roldão Arruda
O presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB), cardeal Raymundo Damasceno, afirmou na sexta-feira, 14,em entrevista ao
Estado que "não se pode instrumentalizar a religião para angariar
votos". O cardeal disse ainda que "no mundo democrático não cabe à
igreja assumir papel político-partidário".
D. Raymundo defende que isenção política deveria pautar
todas as igrejas
As declarações do presidente da CNBB e arcebispo de Aparecida
ocorrem um dia após a divulgação de uma nota da Arquidiocese de São Paulo com
ataques ao PRB, partido de Celso Russomanno, líder nas pesquisas.
O texto, redigido a pedido do arcebispo d. Odilo Scherer,
acusa diretamente o presidente do partido e coordenador da campanha de
Russomanno, Marcos Pereira, pastor licenciado da Igreja Universal do Reino de
Deus. Diz que ele, em artigo publicado em maio de 2011, fomentou a discórdia e
fez críticas destemperadas aos católicos – texto publicado no blog de Pereira
vinculava a Igreja Católica ao chamado "kit gay", material que se
propunha a combater a homofobia. "Se já fomentam a discórdia, ataques e
ofensas sem o poder, o que esperar se o conquistarem pelo voto?", disse a
nota da Arquidiocese de São Paulo.
Apesar de ter sido publicado há um ano e meio, o artigo do
presidente do PRB voltou a circular nas redes sociais depois que um usuário
falso no Twitter passou a enviá-lo várias vezes ao dia a padres e ao perfil do
próprio arcebispo. A página falsa foi criada no dia 10 e só publicou mensagens
sobre o texto de Pereira.
Na sexta, ao comentar a mistura entre religião e política na
campanha eleitoral de São Paulo, d. Raymundo foi enfático: "A posição da
Igreja Católica, enquanto instituição, é de que não deve assumir nenhuma
posição político-partidária. O papa Bento 16, numa de suas encíclicas, Deus É
Amor, foi muito claro ao dizer que a Igreja não pode nem deve tomar nas suas
mãos a batalha política. Isso é próprio dos políticos, dos leigos. A Igreja não
pode ter pretensões de poder."
Indagado se tal posicionamento deveria valer para outras
igrejas, respondeu: "Dentro da minha perspectiva, valeria. No mundo
democrático, o papel que cabe ao Estado e aos leigos não é o mesmo da igreja,
cuja função é de orientar o eleitor." Ainda segundo o líder da CNBB,
"não cabe à igreja assumir papel de protagonista no campo político".
D. Raymundo contou que, assim como líderes evangélicos,
também é procurado por políticos de diferentes partidos e que essas visitas são
mais frequentes nos períodos de eleições para governador e presidente.
"Sempre o fazem de maneira discreta, sem fotógrafos,
nem assessores de imprensa", disse. "Vêm para dialogar e mostrar seus
projetos. Eu sempre digo que podem contar com o meu apoio em tudo aquilo que
diz respeito ao bem da cidade e da população, independentemente de seu partido.
Não podemos instrumentalizar a religião para angariar votos,
evidentemente."
O presidente da CNBB não quis comentar diretamente a nota
divulgada pela Arquidiocese de São Paulo, alegando que não havia tido acesso à
sua íntegra.
Acompanhamento
D. Raymundo disse que a Igreja acompanha o processo
eleitoral em todo o País, com orientações para o voto consciente e estímulos
aos leigos que desejam participar como candidato. "A Igreja estimula,
apoia, vê com bons olhos o leigo que se sente chamado para a política",
afirmou. "Queremos que ele não tenha medo de assumir posições
político-partidárias. Isso é fundamental, porque a sociedade justa vai ser
resultado da ação de homens políticos, homens públicos. Eles é que devem
trabalhar para uma sociedade mais solidária."
Fonte: O Estado de São Paulo
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