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terça-feira, 7 de maio de 2013

Os embalos de sábado à tarde – Os vesperais dançantes de Portel!




Por Samuel Lima (*)


Dia desses parei pra pensar sobre a diferença entre nós, a molecada do passado e a molecada dos dias de hoje. Antes de tudo utilizarei aqui a linguagem coloquial – aquela do vocabulário paraense para dar um melhor tcham nessa crônica. Pois bem, é de bom alvitre salientar que, cada geração possui diferenças de comportamento no tempo e no espaço. É sabido que, com o advento da Internet e de outras geringonças modernas, levaram essa gurizada deixar um pouco de viver a vida como ela é. O bem da verdade sei que, se essas ferramentas existissem em nosso tempo, jamais deixaríamos de utilizá-las – Mas nunca abrir mão de uma pelada de rua, empinar um papagaio, de uma partida de pião, esquiar na lama dentre outras.   

No entanto, o que questiono, são as maneiras como esses indivíduos relegaram essas coisas boas que a vida de moleque outrora proporcionava. Por exemplo, tem deles que passa o dia inteiro à frente do computador, twitando, jogando, fuçando na internet e o facebook. Nunca vi tanto moleque gordo como agora, principalmente, os de cidades grandes. Creio que a coisa mais terrível pra um adolescente sagico do interior é vir pra vida urbana e morar em apartamento. Existe até um ditado entre alguns professores de Educação Física, quando deparam com meninos apáticos, esbravejam: “Esse moleque é muito mole, até parece que é criado em apartamento”. Infelizmente esse é o lado ruim da modernidade. Até parece que também a molecada de hoje não gosta mais de mulher.

Em Portel, no nosso tempo, existiam sim, uns meninos peraltas e traquinos que iam além da conta. Como dizia o Tio Lulú no auge de seus 70 anos: “(...) o mal deles era só fumar a tal da macunha e mexer as coisa malagasalhadas”. O problema surgiu quando o paradigma machista aqui foi quebrado na metade dos anos 80 – quando apareceu a baitolagem que por essas terras rompeu trincheiras - Numa irmandade proveniente de Breves, liderados por Priscila, Zé Carlos e companhia, os quais foram os vanguardistas no ramo da pederastia em nossa Cidade.

Enquanto isso, nós os moleques portelenses, tínhamos de pegar no trampo! Quem queria entrar no cinema tinha de ralar no sítio Paroquial da Comunidade Emaús. Não existiam os bolsas-escolas da vida! Meu pai, logo após fechar seu pequeno comércio no Remanso, voltou a trabalhar na Companhia Amacool. Nossa família era uma vuca de 11 irmãos – uns foram pra Belém estudar, outros tiveram de interromper os estudos para trabalhar. A mamãe naquela época era uma verdadeira economista – pois fazia milagres com um orçamento apertado de dois salários mínimos que meu velho auferia naquela empresa. Pra ajudar nas despesas de casa, fazia cachorro quente, unhas de camarão, chopp, bolo e outras iguarias pra eu e meus irmãos vendermos pra aliviar nas despesas da numerosa família. Havia dias que as vendas eram boas, principalmente nos dias de pagamento da Amacool – por outro lado, eram cruéis, principalmente, quando tínhamos o azar de topar com clientes velhacos e nada amistosos como o Galiota, o Puike e o Tapurú.

Entrementes, o lado bom disso tudo, era jogar peteca valendo, na praça da igreja matriz, e depois, ir pras peladas na praia do Areião. Quando tinha muito moleque pra jogar, dizíamos que ia ter a “macaca” – que era forma de vale-tudo durante a partida e um meio disfarçado pra fazer com os mais fracos desistirem. Depois da Bola, íamos tomar banho no trapiche do seu Duca Leopoldo e brincar adoidadamente de “truviscas” – prática muita arriscada que consistiam em equipes que se digladiavam, saltando de qualquer altura sobre o adversário, estando este dentro ou fora d’água, utilizando chutes e pontapés. Existia o salto mortal chamado de “quebrar o pote”. Em determinada ocasião o “cuiú” desferiu um nos lombos de um moleque que quase este não tornava mais a ter o fôlego e a partir de então, ficamos com medo de o moleque morrer e paramos com essa prática doida. Tínhamos de tomar banhos de cueca e às vezes nus – pra não molhar roupa, pra dar entender que somente fazíamos o dever de casa. Mas não adiantava nada, pois, os olhos vermelhos nos condenavam, e a “porrada comia”. À noite ainda tínhamos de pegar os cadernos e estudar, pois, a professora Margarida não dava moleza!

Com o passar do tempo fiquei mais taludo e o bacana chegou a nossas vidas. Os vesperais dançantes das tardes de sábado.  Ah! Nas tardes dos sábados, as folhas caiam do pau e o pica-pau saía do ovo! Tudo começou com o american way of life (jeito americano de viver), por influência do musical “Thriller” do astro pop Michael Jackson – que aparecia na televisão dançando junto de um bando de zumbis. Era a globalização chegando a terras Tupiniquins, em particular, nas Arucarás. Foi quando o surto da televisão fez febre em nossa pequena cidade.

Nas festividades religiosas de Portel era comum vir times de futebol de outros municípios abrilhantarem o evento. Vinham de Breves, Melgaço, São Sebastião da Boa Vista, Curralinho, Bagre, Oeiras do Pará e de Belém. Mas nossos tradicionais adversários em campo eram os nossos irmãos brevenses.  Como diz o Galvão Bueno “era muito bom ganhar dos brevenses”! Certa vez durante um campeonato das seleções adjacentes, a Seleção Arucará deu uma baita chibatada no escrete de Melgaço por 10 tentos a um. Mas achei que não valeu, pois, o goleiro Amâncio por ser muito franzino era acima de tudo, vesgo. Por outro lado a batalha campal com os “papa mangas”  a coisa era mais difícil.    

Depois dos jogos, a galera debandava pras pistas de dança da sedes Rondonista e Vitória e vez por outras à sede do Fabril. A partir das 16:30 o show começava. As duas principais casas de festa localizam-se próximas do Estádio Municipal e de lá escutávamos o som estridente da aparelhagem e o chamamento (por meio de eco) na voz dos controlistas do Som: “Senhoras e senhores, o nosso cordial boa tarde!tarde!tarde! Neste momentotototo está entrando no ar (arararar) o Somsomsom da Aparelhagem Rondonista Tabajarajajarajara(ou Vitória Régia) para informarmarmarmar que, logo maismaismaiss, a partir das 22h estará acontecendo uma grande festa dançante e você é o nosso convidado especialalalal! Venha e traga a sua famíliamíliamíliamília!” A partir de então as portas eram abertas para a juventude extravasar suas energias e logo, logo, o ambiente já estava cheio de gente. Vale ressaltar que ninguém tinha coragem de entrar na pista pra dançar (fazer a cabeça). Só o Leleco (Aleluia) por ser desinibido era quem o fazia.

Estávamos na “era disco” dos Embalos de Sábado à Noite - As discotecas! As meninas por não gostarem de futebol – chegavam primeiro aos locais dançantes! Umas iam pros vesperais mais enfeitadas que maracás de pajés - como se fosse no “vera” à noite, exalando sempre a Topaze, Charismo, Toque de Amor e Sweety Honest - nichos da Avon da época. Mas quem abria mesmo o espetáculo nas pistas de dança era o “John Travolta Arucará” – O “Pote” e sua trupe (Chicana, Zé Bedeu, Miraldão, Tibi, Chico Spina, Nego Adá, Ciro, Leal, Elson, etc.). Usavam cabeleira Black Power, trajavam camisetas “Najas”, sem mangas com uma frase “BEMSOM”, nas costas. Todavia o que era de admirar, era a indumentária da parte de baixo – A calça comprida fofa - mais bastante afunilada ao tornozelo que na minha imaginação até hoje não entendo como passava pelo calcanhar e do esforço desgraçado pra vesti-la.   

Quando o “Pote” vinha da praia do mangueirão com umas na cabeça, a turma logo dizia: “Abram alas que o Pote chegou e hoje do pau vai cair à folha!” – Muita gente se aglomerava em volta, como quem se aglomera pra ver luta de capoeira.  A performance e a adrenalina deste e dos demais, era de dar inveja a qualquer  Fred Astaire. Era uma mistura de leveza frenética, contorcionismo, acrobacia e dança de rua.  Era caquiado daqui, caquiado dalí, cavalo de pau, carambela. Davam show na pista sem parar para o descanso.
Lá pelas 18h as casas ficavam superlotadas e não havia mais espaços pra ninguém. No controle do som os eficientes DJs, Manoel Tabajara e Chitão, este último, entrava mudo e saía calado. Havia várias tribos naqueles recintos: Os manos da velha guarda - Zé Claudio, Mirute, Leleco, Bag, Batata, Chicago etc; Os manos que estudavam em Belém e se achavam “os caras” por ocasião das férias; As beldades – Dilma Carvalho, Rose Paranhos, Luck, Serenir entre outras. Por último, os meus manos da 4ª, 5ª,6ª e 7ª séries - Pedrinho, os falecidos – Peru e Zé Diniz, Gerson Pereira, Preto da Iracema, Machico, Tapuraia, Denis do Arigó, Zeca do Oton, Koute, Laurinha, Jacirene, Edinamar, Carmem, Marivalda ,Raimundinha, Rosa do Bixuga, Totóia.  Havia duas beldades que estudaram com a gente apenas na 5ª “A”, a Adriana (uma garota mineira) e a Kátia Kely (que veio de Belém) – e eram lindas pra caramba! Dentre todas estas existiam aquelas que viviam sonhando, suspirando com os Menudos e os Dominós que faziam sucesso naquele tempo. Outras deixavam até de copiar da lousa só para ficar de papo com as amigas sobre o assunto. Certa vez, o saudoso professor Afonso Mesquita – por não conseguir dar sua aula ponderou: “Tratem de copiar e estudar o assunto, porque eu duvido se vocês levarem a pior na prova, esses Menudos aí com cara de maricas - vão ajudar vocês”!!! A gargalhada foi geral.  

No Vesperal de sábado à tarde, o Cabra tinha de ser corajoso e partir pra cima da menina pra valer à pena – pra festa da noite não vir aventurar e não pegar nada. Os mais tímidos tinham de pagar aos mais corajosos “fazer o papo” nas meninas objeto de conquista. O legal era que não existia onda de gangue, drogas e terçadadas. Bons tempos aqueles!


*Portelense, economista, pesquisador e atual Secretário de Planejamento em Mazagão-AP samlima17@yahoo.com.br    

         

  

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