Por Samuel Lima (*)
No entanto, o que questiono, são
as maneiras como esses indivíduos relegaram essas coisas boas que a vida de
moleque outrora proporcionava. Por exemplo, tem deles que passa o dia inteiro à
frente do computador, twitando, jogando, fuçando na internet e o facebook.
Nunca vi tanto moleque gordo como agora, principalmente, os de cidades grandes.
Creio que a coisa mais terrível pra um adolescente sagico do interior é vir pra
vida urbana e morar em apartamento. Existe até um ditado entre alguns
professores de Educação Física, quando deparam com meninos apáticos, esbravejam:
“Esse moleque é muito mole, até parece que é criado em apartamento”.
Infelizmente esse é o lado ruim da modernidade. Até parece que também a
molecada de hoje não gosta mais de mulher.
Em Portel, no nosso tempo,
existiam sim, uns meninos peraltas e traquinos que iam além da conta. Como
dizia o Tio Lulú no auge de seus 70 anos: “(...)
o mal deles era só fumar a tal da macunha e mexer as coisa malagasalhadas”.
O problema surgiu quando o paradigma machista aqui foi quebrado na metade dos
anos 80 – quando apareceu a baitolagem que por essas terras rompeu trincheiras
- Numa irmandade proveniente de Breves, liderados por Priscila, Zé Carlos e companhia,
os quais foram os vanguardistas no ramo da pederastia em nossa Cidade.
Enquanto isso, nós os moleques
portelenses, tínhamos de pegar no trampo! Quem queria entrar no cinema tinha de
ralar no sítio Paroquial da Comunidade Emaús. Não existiam os bolsas-escolas da
vida! Meu pai, logo após fechar seu pequeno comércio no Remanso, voltou a
trabalhar na Companhia Amacool. Nossa família era uma vuca de 11 irmãos – uns
foram pra Belém estudar, outros tiveram de interromper os estudos para
trabalhar. A mamãe naquela época era uma verdadeira economista – pois fazia
milagres com um orçamento apertado de dois salários mínimos que meu velho
auferia naquela empresa. Pra ajudar nas despesas de casa, fazia cachorro
quente, unhas de camarão, chopp, bolo e outras iguarias pra eu e meus irmãos
vendermos pra aliviar nas despesas da numerosa família. Havia dias que as
vendas eram boas, principalmente nos dias de pagamento da Amacool – por outro
lado, eram cruéis, principalmente, quando tínhamos o azar de topar com clientes
velhacos e nada amistosos como o Galiota, o Puike e o Tapurú.
Entrementes, o lado bom disso
tudo, era jogar peteca valendo, na praça da igreja matriz, e depois, ir pras
peladas na praia do Areião. Quando tinha muito moleque pra jogar, dizíamos que
ia ter a “macaca” – que era forma de vale-tudo durante a partida e um meio
disfarçado pra fazer com os mais fracos desistirem. Depois da Bola, íamos tomar
banho no trapiche do seu Duca Leopoldo e brincar adoidadamente de “truviscas” –
prática muita arriscada que consistiam em equipes que se digladiavam, saltando
de qualquer altura sobre o adversário, estando este dentro ou fora d’água, utilizando
chutes e pontapés. Existia o salto mortal chamado de “quebrar o pote”. Em
determinada ocasião o “cuiú” desferiu um nos lombos de um moleque que quase
este não tornava mais a ter o fôlego e a partir de então, ficamos com medo de o
moleque morrer e paramos com essa prática doida. Tínhamos de tomar banhos de
cueca e às vezes nus – pra não molhar roupa, pra dar entender que somente fazíamos
o dever de casa. Mas não adiantava nada, pois, os olhos vermelhos nos
condenavam, e a “porrada comia”. À noite ainda tínhamos de pegar os cadernos e
estudar, pois, a professora Margarida não dava moleza!
Com o passar do tempo fiquei mais
taludo e o bacana chegou a nossas vidas. Os vesperais dançantes das tardes de
sábado. Ah! Nas tardes dos sábados, as
folhas caiam do pau e o pica-pau saía do ovo! Tudo começou com o american way
of life (jeito americano de viver), por influência do musical “Thriller” do
astro pop Michael Jackson – que aparecia na televisão dançando junto de um
bando de zumbis. Era a globalização chegando a terras Tupiniquins, em
particular, nas Arucarás. Foi quando o surto da televisão fez febre em nossa
pequena cidade.
Nas festividades religiosas de
Portel era comum vir times de futebol de outros municípios abrilhantarem o
evento. Vinham de Breves, Melgaço, São Sebastião da Boa Vista, Curralinho,
Bagre, Oeiras do Pará e de Belém. Mas nossos tradicionais adversários em campo
eram os nossos irmãos brevenses. Como
diz o Galvão Bueno “era muito bom ganhar dos brevenses”! Certa vez durante um
campeonato das seleções adjacentes, a Seleção Arucará deu uma baita chibatada
no escrete de Melgaço por 10 tentos a um. Mas achei que não valeu, pois, o
goleiro Amâncio por ser muito franzino era acima de tudo, vesgo. Por outro lado
a batalha campal com os “papa mangas” a
coisa era mais difícil.
Depois dos jogos, a galera
debandava pras pistas de dança da sedes Rondonista e Vitória e vez por outras à
sede do Fabril. A partir das 16:30 o show começava. As duas principais casas de
festa localizam-se próximas do Estádio Municipal e de lá escutávamos o som
estridente da aparelhagem e o chamamento (por meio de eco) na voz dos
controlistas do Som: “Senhoras e senhores,
o nosso cordial boa tarde!tarde!tarde! Neste momentotototo está entrando no ar
(arararar) o Somsomsom da Aparelhagem Rondonista Tabajarajajarajara(ou Vitória
Régia) para informarmarmarmar que, logo maismaismaiss, a partir das 22h estará
acontecendo uma grande festa dançante e você é o nosso convidado especialalalal!
Venha e traga a sua famíliamíliamíliamília!” A partir de então as portas
eram abertas para a juventude extravasar suas energias e logo, logo, o ambiente
já estava cheio de gente. Vale ressaltar que ninguém tinha coragem de entrar na
pista pra dançar (fazer a cabeça). Só o Leleco (Aleluia) por ser desinibido era
quem o fazia.
Estávamos na “era disco” dos
Embalos de Sábado à Noite - As discotecas! As meninas por não gostarem de
futebol – chegavam primeiro aos locais dançantes! Umas iam pros vesperais mais
enfeitadas que maracás de pajés - como se fosse no “vera” à noite, exalando
sempre a Topaze, Charismo, Toque de Amor e Sweety Honest - nichos da Avon da
época. Mas quem abria mesmo o espetáculo nas pistas de dança era o “John
Travolta Arucará” – O “Pote” e sua trupe (Chicana, Zé Bedeu, Miraldão, Tibi,
Chico Spina, Nego Adá, Ciro, Leal, Elson, etc.). Usavam cabeleira Black Power,
trajavam camisetas “Najas”, sem mangas com uma frase “BEMSOM”, nas costas.
Todavia o que era de admirar, era a indumentária da parte de baixo – A calça
comprida fofa - mais bastante afunilada ao tornozelo que na minha imaginação
até hoje não entendo como passava pelo calcanhar e do esforço desgraçado pra
vesti-la.
Quando o “Pote” vinha da praia do
mangueirão com umas na cabeça, a turma logo dizia: “Abram alas que o Pote
chegou e hoje do pau vai cair à folha!” – Muita gente se aglomerava em volta,
como quem se aglomera pra ver luta de capoeira. A performance e a adrenalina deste e dos
demais, era de dar inveja a qualquer Fred Astaire. Era uma mistura de leveza
frenética, contorcionismo, acrobacia e dança de rua. Era caquiado daqui, caquiado dalí, cavalo de
pau, carambela. Davam show na pista sem parar para o descanso.
Lá pelas 18h as casas ficavam
superlotadas e não havia mais espaços pra ninguém. No controle do som os
eficientes DJs, Manoel Tabajara e Chitão, este último, entrava mudo e saía
calado. Havia várias tribos naqueles recintos: Os manos da velha guarda - Zé
Claudio, Mirute, Leleco, Bag, Batata, Chicago etc; Os manos que estudavam em
Belém e se achavam “os caras” por ocasião das férias; As beldades – Dilma
Carvalho, Rose Paranhos, Luck, Serenir entre outras. Por último, os meus manos
da 4ª, 5ª,6ª e 7ª séries - Pedrinho, os falecidos – Peru e Zé Diniz, Gerson
Pereira, Preto da Iracema, Machico, Tapuraia, Denis do Arigó, Zeca do Oton, Koute,
Laurinha, Jacirene, Edinamar, Carmem, Marivalda ,Raimundinha, Rosa do Bixuga,
Totóia. Havia duas beldades que
estudaram com a gente apenas na 5ª “A”, a Adriana (uma garota mineira) e a
Kátia Kely (que veio de Belém) – e eram lindas pra caramba! Dentre todas estas
existiam aquelas que viviam sonhando, suspirando com os Menudos e os Dominós
que faziam sucesso naquele tempo. Outras deixavam até de copiar da lousa só
para ficar de papo com as amigas sobre o assunto. Certa vez, o saudoso
professor Afonso Mesquita – por não conseguir dar sua aula ponderou: “Tratem de
copiar e estudar o assunto, porque eu duvido se vocês levarem a pior na prova,
esses Menudos aí com cara de maricas - vão ajudar vocês”!!! A gargalhada foi
geral.
No Vesperal de sábado à tarde, o
Cabra tinha de ser corajoso e partir pra cima da menina pra valer à pena – pra
festa da noite não vir aventurar e não pegar nada. Os mais tímidos tinham de
pagar aos mais corajosos “fazer o papo” nas meninas objeto de conquista. O
legal era que não existia onda de gangue, drogas e terçadadas. Bons tempos
aqueles!
*Portelense, economista,
pesquisador e atual Secretário de Planejamento em Mazagão-AP
samlima17@yahoo.com.br
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