*Por Samuel Barbosa de Lima
Por ocasião de minha estada na minha querida Cidade-Natal, Portel-PA,
tirei o dia de hoje para andar por essa pólis. Trilhei pelas ruas a pé
como um saudoso peregrino que retorna a pátria mãe, após a libertação do
cativeiro.
Caminhei pelo comércio, passei em frente ao paço
municipal, em frente da igreja matriz, admirei o formato da edificação
do novo prédio do capitólio e tantos outros. Mas o que me impressionou
mesmo foi o prédio da instituição de ensino que, quase me fez chorar.
Em 1980, no verdor dos anos. Quando do alvorecer da radiante juventude,
ainda em plena ditadura militar brasileira, fui matriculado no Grupo
Escolar Paulino de Brito. Naqueles idos, começava a olhar a vida como um
tempo obsequiado pelo Doador da Existência, para que, enquanto ele
durasse -, escrevesse páginas de minha história.
Depois que
meu pai saiu da Companhia Amazonas, não pude mais permanecer matriculado
no educandário que possuía a nomenclatura homônima daquela firma. Com
esse fato, entrei nesse Templo do Saber, o Paulino de Brito. A estoica
Maria da Paz, da ordem normalista, era quem dirigia essa academia do
conhecimento, que, preparou algumas gerações que iriam deixar pegadas
fulgurantes por onde quer que passasse.
Vivi ali a sonhada
fantasia e os devaneios dos sonhos de um adolescente pobre que sonhava
um dia chegar aos bancos acadêmicos. Essa meta, como a miragem no
deserto, alimentava a minha esperança de um dia encontrar o oásis
distante da universidade.
Ainda infante, transpus os umbrais do
pórtico imponente que dominava a entrada daquele majestoso prédio, que
hoje caminha para quase meio século.
É impossível descrever o
turbilhão de pensamento que fervilhavam em minha mente naqueles
distantes dias do início de uma longa caminhada. Estava disposto
enfrentar impolutamente o desafio eterno que se trava entre o
conhecimento e as trevas da ignorância.
Estava determinado não
me deixar vencer pelo desânimo, pelo desalento ou reveses momentâneos da
vida, embora isso tenha ocorrido mais tarde.
Durante anos
entrei e sai por aquele portão, que se tornou tão familiar, como os
umbrais da minha humilde casa. Vivi alegrias e decepções, como qualquer
jovem que começa a perscrutar os enigmas da vida.
A alegria
esfuziante na hora do recreio, as brincadeiras em sala de aula, a tensão
na antevéspera das provas, as viradas das noites indormidas e o pavor
das provas orais.
Não posso esquecer-me do método rígido da
postura das professoras, que em determinada ocasião, uma me deu nota
zero, devido estar dando cola para uma colega. No dia seguinte, para me
vingar, a mesma discente pediu-me ajuda novamente na prova de outra
professora.
Era uma avaliação de ciências, cuja pergunta assim
demandava: “Onde estão localizados os genes letais”. A resposta: “No
interior dos cromossomos”. Dessa vez, para não correr risco, de a prova
da aluna preguiçosa, coincidir com a minha, disse a resposta errada, em
tom de sarcasmo: “Na margem direita do Rio Amazonas”. E assim
sapecou-lhe, sem pestanejar.
Em maio de 1986, tive de
interromper os estudos por questões de trabalho e no ano seguinte,
devido ao Serviço Militar Obrigatório, minha família mandou-me à Belém
para me alistar.
Passados três anos, retornei aos estudos pra
Macapá. Estava agora com 21 anos. Depois de haver dado baixa do
Exército, tinha uma nova visão do mundo. Mesmo durante a minha estada na
caserna, nem por isso havia perdido o amor pelos livros e pela leitura.
Daquela turma do Paulino de Brito, com cerca de 30 alunos, alguns se
dispersaram, para cuidar dos estudos em outros lugares. Muitos deles
nunca mais os encontrei nos caminhos da vida. Mais de três décadas
depois, voltei agora a esse Templo do Saber.
A planta
arquitetônica um pouco mudada. De longe ouvi o burburinho da juventude.
Os meus pensamentos voaram no vazio do tempo e nos tempos passados -, e
parecia ouvir o som das gargalhadas e as algazarras distantes -, daquela
juventude daqueles dias.
Apresentei na portaria tão familiar.
Novamente transpus o mesmo portal que há 34 anos me recebeu. Era como
se ele me dissesse: “Bravo amigo, apesar das lutas não me
decepcionastes. Milhares de jovens esperançosos por aqui entraram como
você, naqueles idos de 1980. Muitos desistiram. Outros, não souberam
aproveitar o tempo da vida. Estou feliz por você ter conseguido”.
Com aquelas palavras ainda parecendo ecoar em meus ouvidos -, vi-me
diante de uns alunos. Falei quem era. Disse que fui também aluno desse
educandário. Disse que fiz na vida e o que estava fazendo.
Não
pude visitar uma sala de aula e contar um pouco de minha história, pois,
percebi que nesse período escolar, é tempo de recuperação. No entanto,
gostaria muito de ter podido contar a minha resignada e tenaz trajetória
estudantil.
Com isso, apenas apertei a mão e falei com alguns
estudantes. Eram diferentes. Não podia ser de outra forma. Mais de
trinta anos havia se passado. Foi quando despertei e falei comigo mesmo:
“É verdade, estamos em outro século”.
Despedi-me. Dei uma
última olhada para aquele colégio, que parecia acenar-me dizendo adeus.
Não sei se ainda um dia voltarei àquela Casa que ajudou a forjar meu
caráter para os dias do porvir.
Por hoje é só pessoal. Saudações arucarás!
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